segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Mercy - Parte 03

- Você esta bem, Clara ? - era a voz de Dave.

Ele me ajudou a sentar e eu não entendia o que estava acontecendo. Então entre todos que me observavam assustados, estava Samuel. Como uma sombra ele passou pelas pessoas e saiu pela porta. Antes deixou em cima de uma das mesas o anel. Como ele fez isso ?

Dave me levantou e me segurou pelo braço. Ele era alto e desceu o rosto para me olhar nos olhos.

- Clara … Você esta me ouvindo ?

Eu estava, mas eu ainda precisava de uns minutos. Fiz apenas uma afirmação com o rosto e ele me sentou numa das cadeiras. Eu não tirava os olhos no anel.

- Pessoal, tudo bem foi somente um desmaio ela esta bem... - Dave afastou as pessoas de mim e senti seus grandes olhos castanhos nos meus.

Eu segurei firme seu braço

- Eu sei onde estão as garotas da reportagem, Dave.

Uma coisa eu precisava reconhecer, Dave era pratico e eu gostava disso nele. Ele segurou minha mão e andamos em direção a saída. Antes peguei o anel e o coloquei no bolso.

Quando chegamos na rua eu senti medo por ele. Dave ainda me observava e ele confiava em mim. Eu já não sabia do que Samuel ou estes eles eram capazes e decidi que era melhor ir sozinha.

- Dave, você precisa ir atrás de Benjamim. Quem esta com as garotas é um Nasu, seja lá o que for isso. Ele esta num prédio abandonado perto da saída da cidade.

- Clara, como você sabe... - eu precisava ser firme e o silenciei com a mão

- Dave, não temos tempo. Precisa ir, você é mais rápido que eu. Minha perna esta sangrando – menti - Eu vou voltar para o hotel.

- Certo. Você vai ficar bem ? - ele ainda estava relutando em me deixar e me analisou novamente

- Elas não tem muito tempo, Dave - e ele foi.

Vi ele com o telefone correndo na direção contrária que eu queria ir. O cemitério estava a apenas alguns quarterões. Fui para trás de um carro e fiquei observando Dave. Assim que Benjamim e Gregório chegaram os três procuraram por mim por algum tempo. Era melhor mantê-los em segurança.

Escutei o barulho do carro saindo e não havia mais sinal deles na rua. Segui até o cemitério a pé. Quando cheguei já estava quase noite e o vento gelado fez meu corpo arrepiar. Tinha uma entrada enorme como nos filmes, um grande arco preto com enormes arcanjos esculpidos. Eram assustadores.

As folhas secas da estação voavam por entre mim e as sepulturas e por alguns instantes que tive a impressão de estar sendo seguida. Eram tantas estatuas e anjos nas sepulturas que eu devia estar ficando maluca. Pelo menos Samuel não poderia entrar aqui, foi o que ele disse. Mas eu não sabia se podia acreditar nele.

Uma pequena luz em uma capela no fundo do cemitério chamou minha atenção. A porta estava semiaberta. Primeiro olhei em volta para me certificar que não tinha nada me observando e me aproximei com calma. A porta fez um pequeno barulho devido a ferrugem das fechaduras e escutei alguma coisa no fundo da capela.

A capela era uma sepultura e tive que descer um lance de escada para chegar ao inicio dela. Dentro da capela atrás de uma das criptas abertas tinha uma passagem de onde vinha a claridade. Era outro lance de escada, mas para cima dessa vez. Estava muito escuro e eu não sabia onde estava. Quando cheguei a claridade, vi minhas mãos sujas de sangue, assim como tudo em volta. Olhava minhas mãos ensaguentadas e vi dentro de uma das criptas uma garota viva. Ela estava toda cheia de sangue e implorava por ajuda – Me ajuda, por favor. Ele vai voltar … ela sussurrava sem voz.

Um grande barulho como um ruido de um animal faminto veio do fundo da cripta e a garota foi puxada por alguma coisa. Eu escutei o estralho do barulho de ossos sendo devorados e então outro ruido. Não era humano, era assustador.

Antes da pedra da cripta se mover dei alguns passos para trás mantendo os olhos de onde vinha o barulho. Tropecei algumas vezes antes de chegar a ponta da escada. Foi quando uma mão tocou meu ombro e o grito que estava na garganta saiu.

Rolamos escada abaixo. Não sei o que era ou quem era, mas insistia em manter as mãos em mim e eu tentava me afastar. Quando a queda terminou estava escuro e eu batia tentando me defender. Então escutei o barulho novamente no alto da escada e uma mão cobriu minha boca para que eu fizesse silêncio e com a outra prendeu meu corpo firme ao chão.

Quando a criatura saiu do alto Benjamim ligou uma pequena lanterna e só então percebi que era ele. Estavamos tão próximos que eu sentia o cheiro de menta da boca dele e o aroma de café dos cabelos claros que caiam sobre meu rosto. Ele tirou a mão da minha boca e nos olhamos por alguns segundos.

Foi quando uma voz sussurrou no meu ouvido:

- Saia dai, Clara – era a voz de Sam.

Nos levantamos e andamos até a saída da capela. Ele tinha uma arma engatilhada e não tinha nada de suave em suas expressões. Seus olhos azuis estavam escuros. Andamos em passos lentos até a entrada da cripta que dava acesso a saída da capela.

- Como ? - sussurrei enquanto ele me empurrava escada acima

- Quando Dave me falou que era um Nasu este é o único lugar que eles ficam – já estávamos fora da capela e ele segurou meu braço – Qual o seu problema ? Vir aqui sozinha ….

Mas antes que ele terminasse de falar paralisamos. O único som que escutei foi um grito infernal da fera em nossa frente e o disparo da arma de Benjamim ao mesmo tempo. Fiquei surda por alguns segundos, tempo suficiente para o Nasu desviar da bala e acertar Benjamim em cheio com os dois pés. Tentei correr na direção de Ben, mas antes do terceiro passo senti meus pés no ar e o impacto do meu corpo contra a porta da capela.

Primeiro era apenas um suspiro, como se eu estivesse no fundo do mar. Algo me chamando. Depois o som foi ficando mais claro e reconheci a voz de Sam:

- Acorda, Clara … Clara...

Abri os olhos num susto. Por estar viva ainda, por estar escutando a voz de Sam e por estar pressa com as mãos amarradas dentro de uma cripta. Tentei me virar, mas o corpo pesado de Benjamim ao meu lado bloqueava minhas tentativas. Ele ainda estava desacordado e um novo som fez meu corpo arrepiar.

O som era distante, mas eu sabia que era o que tinha nos atacado. Virei meu corpo com cuidado para não fazer nenhum barulho e vi o ferimento no rosto de Ben. Mas uma vez o som foi ficando próximo e eu precisava pensar em uma maneira de sair dali.

Benjamim se moveu e estávamos tão próximos que eu sentia o coração dele acelerado tanto quando o meu. Os olhos dele estavam num tom azul mais claro quando ele os abriu e me observavam atentamente.

- Você esta ferida ? - ele agora parecia preocupado

- Não. Acho que não. Eu não sei porque você veio, eu tinha tudo …

- E você acredita que ia dar certo, você sozinha … - o tom da voz dele era suave, mas irônico.

- Eu não queria que você tivesse vindo ou se ferido, eu … - eu estava sendo sincera.

- Eu nunca deixo para trás as pessoas com as quais eu me importo. Eu não queria , não quero que você se machuque.

Eu calei, eu não sabia o que responder. Eu estava surpresa. Ele começou a se mover ficando de costas para mim e me disse

- Tem uma chave no meu bolso de trás, você consegue pegar ?

Em alguns minutos já estávamos fora da cripta. Ele tinha removido a tampa e nos tirado de lá. Dentro de uma das criptas do lado tinha uma menina ainda viva e fiz sinal para que ela ficasse em silêncio.

Benjamim abriu a cripta de onde ela estava e eu fiquei mais afastada. Ele tinha tirado o casaco e envolvido a garota nos braços dele. Eu senti uma pontada de inveja dela. Ele a levou até onde eu estava e a colocou próxima a mim e perguntou diretamente para ela, eu não pude deixar de ver a mão dele no rosto dela.

-  Tem mais alguém vivo aqui ? - ele estava sendo gentil de uma maneira que eu não tinha visto ainda e eu estava ficando incomodada.

Ela respondeu que sim, entre lágrimas, e ele secou com a outra mão.

- Onde estão ?

Ela apontou para a direção de onde vinha antes o barulho do Nasu e Benjamim levantou e falou diretamente para mim.

- Fique aqui com ela, vou ver se tem mais alguém lá – mas antes dele sair eu segurei o braço dele.

- É perigoso. Ele está lá – eu segurava o braço dele com força e não tinha a intenção de soltar.

- Ei, vai ficar tudo bem – ele passou as mãos pelo meus braços na lateral e depois a mão no meu rosto. Tinha sangue – E você mentiu, que não tinha se machucado.

Eu não tive reação quando ele tirou a minha mão do seu braço e foi na direção da escuridão. Eu escutava os passos dele no chão de terra e a garota se encolheu quando escutamos o grito do Nasu.

Entre o som de socos e barulho de luta, tudo ficou em silêncio. Não sabíamos o que esta vindo em nossa direção, mas algo esta vindo. A garota estava apavorada e eu a levantei:

- Corre, corre o mais que puder – ordenei e lancei escada a cima. Enquanto ela corria fui na direção da escuridão. Algo vinha em minha direção lentamente. Antes que eu pudesse gritar com a claridade de uma mão com sangue me segurando, eu reconheci o toque de Benjamim. Ele estava com outro ferimento no rosto e com o braço sangrando. Eu o ajudei a andar até a beira da escada.

- Ele esta morto ?

Mas não foi Benjamim que respondeu minha pergunta. Dave que vinha logo em seguida tirou as minhas mãos do braço de Ben:

- Sim, vamos precisamos sair antes que a explosão nos machuque.

Quando chegamos fora da sepultura a garota que nos esperava correu para os braços de Benjamim e eu não sabia como reagir. Ele a abraçou e vi que Dave me observava.

Samanta tinha longo cabelos claros e lindos olhos verdes, além do mais obvio, tinha um corpo espetacular. Ela estava com o vestido rasgado e sujo de sangue e Benjamim tirou sua camiseta e a Samanta vestiu. Não posso dizer que ver o formato dele não me deixou impressionada, mas ela com a camiseta dele...

Dave parecia estar adorando a cena e se aproximou de mim com seus grandes olhos tentadores e maldosos:

- Linda ela não ?

- Linda Dave porque não oferece sua camiseta para ela também, vai mantê-la mais aquecida …. falei e fui na direção da porta do Hospital, mas ele me segurou

- Por que eu somente ofereceria para você.

Eu não disse nada e vi que quando sai na porta Benjamim estava com ele. Eu já tinha muitos problemas para resolver. Eu ainda não fazia ideia do que a agenda era ou significava e o retorno de Samuel. A melhor coisa era me afastar mesmo de Dave e com certeza de Benjamim.

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